segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

*QUEM DISSE QUE CIGARRO FAZ MAL À SAÚDE?

Em tempos onde tanto se fala do tabaco e dos seus perigos à saúde, o jovem diretor Jason Reitman inova no assunto e o apresenta em uma abordagem que dificilmente se esperaria de um diretor jovem e aparentemente com tão pouca experiência.

Jason Reitman, canadense de 32 anos, é formado pela Harvard-Westlake School e pela University of Southern California's School of Cinema-Television. Filho do também diretor Ivan Reitman e da atriz Geneviève Robert, Jason chegou a trabalhar como ator, antes de iniciar sua carreira de diretor. Sendo assim, ele possui em seu currículo, uma filmografia curta, mas de muita qualidade e bem premiada. Tanto na direção quanto na elaboração do roteiro, as obras de Reitman se distribuem da seguinte forma: os curtas-metragens Operation (1998), H@ (1999), On God We Trust (2000), Gulp (2001), Uncle Sam (2002) e Consent (2004). Já os mais recentes, são os dois longas: Obrigado por Fumar (2005) e Juno (2007).

O filme Obrigado por fumar, conta a divertida trajetória profissional de um lobbysta estadunidense chamado Nick Naylor (Aaron Eckhart), que trabalha para empresas que têm no cigarro sua maior fonte de renda. Nos EUA, é legal e reconhecida a profissão de quem faz lobby, ou seja, quem trabalha para uma empresa ou organização e tem como atividade profissional buscar influenciar, explicitamente ou não, decisões do poder público, em favor de determinados interesses privados.

Desse modo, durante o longa inteiro, Nick Naylor, possuidor de uma retórica impressionante, defende e argumenta sobre o uso do tabaco, tendo como mote principal, a liberdade de escolha das pessoas. Nick chega a argumentar, logo no início do filme, em um típico programa televisivo de debates, que é melhor que o jovem com câncer pulmonar, ali presente, viva e continue fumando; do que morra para “pura e simplesmente” provar os malefícios do cigarro. No debate, era possível notar que Nick, porta-voz da Academia de Estudos do Tabaco (financiada pelos grandes empresários do ramo), estaria em desvantagem frente a vários defensores do não uso do cigarro. Porém ao final deste, toda a platéia, e até o menino canceroso, aplaudem-no e se deixam levar pela sua argumentação.

Paralelo a sua carreira profissional, Nick é separado da mulher e tem um filho, Joey Naylor (Cameron Bright). E é aí, que se instala outra problemática do filme: Nick vê seu filho cada vez mais o idolatrando e sentido orgulho de sua profissão. Por esse motivo ele se questiona se estaria cumprindo sua função de pai ao ensinar para Joey a importância de se argumentar e até de manipular se for preciso.

Constantemente Nick Naylor precisa lutar contra o oportunista Senador Ortolan Finistirre (Willian W. Macy), criador tem um projeto de lei, no qual a imagem de uma caveira com ossos e a palavra veneno (poison) devam ser postas em todas as embalagens de cigarro. O objetivo está claro: alertar contra o uso do cigarro e tentar diminuir os grandes lucros das empresas tabaqueiras. Naylor tem uma ideia, que há muito tempo já havia dado certo: voltar a pôr o cigarro no cenário de Hollywood, com o intuito, também claríssimo, de passar a imagem da sensualidade e prazer, o que logicamente aumentaria as vendas do cigarro novamente.

Porém antes disso, Nick Naylor tem a missão de se apresentar ao todo poderoso chefe do tabaco, O Capitão (Robert Duval), que se identifica com Naylor e aprova a ideia do cinema e todas as pseudo-campanhas contra o tabagismo. Além disso, pede a ele que entregue uma doação (diga-se de passagem, propina) a

No tocante as relações sociais, Nick Naylor tem apenas dois amigos próximos: Polly Bailey (Maria Bello), que trabalha pelos interesses da indúsria de bebidas, e Bobby Jay (David Koechner), defensor da indústria bélica americana. A irônica turma se auto-intitula MDM (Mercadores da Morte), e sempre se encontra para discussões do tipo: quem tem a maior estatística de morte provocada por seus produtos e como achar meios para se livrar da imprensa, aliás, a instituição que mais os incomoda.

E falando em imprensa... Nick Naylor se deixe enganar e cai nas sedutoras insinuações de uma repórter Heather Holloway (Kate Holmes), sem muita ética profissional, que ao saber dos planos sobre a inserção de cigarros em filmes e da existência do grupo MDM, redigi uma longa e impactante reportagem sobre submundo do cigarro. Após se aproveitar de todas as informações oferecidas por Nick, ela o larga sem maiores remorsos. Nick Naylor, que havia sofrido um seqüestro e estava se usando disso para promover a empresa tabaqueira como vítima, perde não só o recente prestígio social como também o emprego na Academia.

Porém, Naylor se usa da imprensa também: vai a público e em uma entrevista coletiva, esclarece o desejo de “limpar os nomes” das pessoas envolvidas na reportagem. Aproveitando-se do espaço ele reafirma a sua presença na audiência pública e sai novamente de cabeça erguida.
Já no dia da audiência pública acerca da inserção do símbolo de aviso do perigo nos cigarros, muitas autoridades no assunto são convidadas e novamente o único que possui a árdua missão de defender o tão polêmico tabaco, é Nick Naylor. Com sua argúcia invejável, ele consegue mostrar para todos a inutilidade daquele projeto de lei, se justificando do seguinte modo: todos já sabem do perigo que o cigarro representa e só o usam por escolha própria (motivo este, que ele também usa, caso o filho, quando maior, queira fumar: tudo depende da escolha dele, do filho).

Ao término da audiência, BR (J.K. Simmons), ex-chefe de Naylor, o convida novamente para trabalhar junto à Academia de Estudos do Tabaco. Nick Naylor recusa frente a toda a imprensa, pensando na imagem que estaria criando para seu filho e também na criação moral que sujeita este. Não desistindo do seu talento para o falar, Naylor monta seu próprio escritório de Relações Estratégicas e continuou atendendo empresários de atuação, digamos, não muito ética.

Desse modo é interessante destacar, como Jason Reitman conduziu sua obra. Sabendo dosar muito bem o humor (que não chega a ser ridículo, mas cínico) com temáticas sociais tão presentes no nosso dia a dia, ele nos apresenta um filme que poderia ser o mais previsível possível, porém nos surpreende pela agilidade/dinamismo com que ocorrem os fatos e pela imprecisão que isso acarreta.

Além disso, Reitman em Obrigado por fumar, desde o início dá mostra do andamento irônico que se terá na obra. A abertura com o nome dos atores em embalagens de cigarro poderia levar a questionamentos futuros sobre o poder de visualização que se teria desse material, caso a tal caveira com ossos e a inscrição “veneno” houvesse sido inserida nas embalagens deste produto.

Ademais, outro detalhe interessante, é que Reitman não usou um cigarro sequer durante todas as cenas e cenários, em um filme onde o próprio título faz alusão ao seu uso. E também a interposição na obra, de imagens verídicas de uma cobertura jornalística, quando outros “capitães do tabaco” estavam sendo processados e condenados a pagar volumosas multas por prejuízo de uma sociedade inteira, o que faz com que esse hibridismo (ficção e realidade) ultrapasse os limites da tela.

Assim, é impossível não analisar outros subtemas implícitos na obra de Reitman, como: a ética profissional, a relação negócios versus imprensa e até mesmo a busca incessante de um furo de reportagem que nem sempre respeita os limites da dignidade humana e da própria ética já citada.

Dessa forma, numa análise crítica mais profunda, poder-se-ia falar que a ética profissional resume-se a trabalhar dentro dos parâmetros morais tidos como corretos pela sociedade e o Estado, mas isso vai muito além. Pois para a fictícia Academia de Estudos do Tabaco, representa muito bem uma prática comum no mercado liberal: grandes empresários que não se comprometem com a responsabilidade social que deveria ser exercida por suas empresas, se importando apenas pelo rentável fruto do capitalismo; o lucro.

Por isso não é tão fácil perceber que a própria argumentação constantemente utilizada pelo personagem Nick Naylor, a de que “todos têm o direito de escolha”, é infundada. Partindo do princípio que a propaganda, aqui no caso comercial, tem como uma de suas obrigações influenciar para que o consumidor deseje o seu produto e o compre, haveria possibilidade para se dizer que este cidadão não é “orientado” (vamos usar um eufemismo) a realizar tal compra? Depois, as propagandas subliminares do próprio cigarro estão aí para indicar o contrário do que é afirmado pelo lobbysta. E exatamente por serem subliminares, tais propagandas mostram ambientes paradisíacos, apresentam a imagem do cigarro sempre ligada a um forte apelo sexual e a horas de lazer, de descanso. A partir daí, já se pode refletir se esse consumidor é respeitado no seu direito de escolher ou se ele é induzido a realizar tal ato.

Sendo muita importante para as empresas, que sua imagem seja respeitada no mercado a qualquer custo, também deveríamos ressaltar a importância dada aos meios de comunicação e a mídia para que essa imagem seja positiva ou negativa. O poder de influenciar, não está presente só na indústria do tabaco, pelo contrário: os próprios anunciantes de cigarro até pouco tempo se usavam da televisão (que é de grande alcance da população), para apresentar maravilhosamente seus produtos, num hedonismo indescritível.

Para estudantes de Administração de Empresas, o filme seria uma ótima recomendação, por mostrar a forma como as empresas tomam atitudes (se éticas ou não, é outro assunto relevante para se debater) frente a desafios e/ou ameaça de diminuição de vendas de seus produtos. Já aos estudantes de Comunicação Social, a película se torna fundamental para entendermos esse relacionamento dúbio entre os meios de comunicação (de quaisquer mídias), que ora se dizem empenhados em esclarecer a população e defendê-la da desinformação, e ora apresentam de forma glamourosa e insinuante anúncios mostrando o quão é “útil e necessário” determinado produto. É imprescindível também, que estes alunos analisem a forma como por décadas seguidas, o cinema hollywoodiano, apresenta o cigarro continuamente atrelado ao seu star system de atores do momento (é interessante notar que no próprio filme há uma irônica menção deste fato).


De todo modo, o filme Obrigado por fumar, é indispensável, seja para um público fumante ou não-fumante, que se interesse em descobrir de forma leve e engraçada, o que há por trás destas tão solidificadas e nada transparentes empresas tabaqueiras.
LOPES DA SILVA, Anderson


*Resenha crítica escrita como forma de avaliação para a disciplina de ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS EM COMUNICAÇÃO, ministrada pela Prof. mestranda Larissa E. B. Balan Leal.

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